terça-feira, janeiro 23, 2007

Três textos.


Cidadão Ser-Humano

Teorias, discussões, política, discussões, música, a cidade, as pessoas - que são sempre os outros - os vagabundos, os ladrões, os desonestos, os moralistas, os religiosos, os desonestos, as pessoas, enfim - afinal, as pessoas são sempre os outros.
Copntinuamos. Eleições, frustrações, escolhas, prioridades, desejos, escolhas, permanecemos.
Emprego, patrões, desemprego, despatriotas, leis, contra-leis, leis, leis, cerco fechado, vagabundos despatriotas, permanecemos, escolha, errados, felizes, infelizes ou nem têm noção disso?
Música ruim, boa, monótona, inteligente, sonora, dançante, entediante, trabalho, trem, ônibus, lotação, trem, trânsito, trem, trabalho, trânsito, trem, trânsito, trabalho, troca, troco, retorna ao teto e transa satisfeito.
Arte, sobrevida, acerta, arruma, se vira, discute, pensa, acha, acerta e sempre erra, serve, não serve, sempre serve, trabalha, trânsito, transa, enjoa, enoja, reza, continua, permanece.
Bebe, fuma, balcão, rua, pede, traz, traga, cheira, entope, vende o dele, busca o seu, insiste, acalma, enerva, briga e busca mais, acalma, acalma, bebe, fuma, balcão, rua, etc., etc., etc.
Nasce, cresce, envelhece, reproduz, envelhece mais, sempre fazendo merda, morre de vez e esquece.
Luta. estuda, emprego, salário, salário, verão, décimo-terceiro, família, férias, sol, cerveja, churrasco, e esquece que é hora da luta.
já passou o carnaval. Feriado, são joão, pátria, morta, feriado, feriado, verão, férias, sol e continua, permanece.
Segunda, cerveja, vinho, pinga, vodka, tequila e domingo.
Nasce, continua, Freud. Cresce, permanece. Reproduz, continua, sexo. Envelhece, permanece, frustra. Morre, e vai-se lá saber!
Nasce, vida, vida, vida, e no final um gole de ar com gosto de morte.


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Hoje não!

O repórter na tv, o barulho da rua por trás, dizendo sobre trânsito e atrasos. Algo que poderia influenciar minha vida, mas hoje não.
A tv ligada no bar, e fala sobre o governo, sobre tudo isso. Algo que influencia minha vida, mas hoje não.
A tv desligada, e sempre tem alguém que reclama. Alguém que pode interferir minha paz, mas hoje não, ligo o rádio no ouvido.
Músicas podres e chatas. Quem quer saber? Saio andando.
Chuva fina e vento frio. Algo que poderia estragar a noite de qualquer um. A minha não, tomo banho na noite.
As roupas encharcadas quando entro no bar. Peço uma cerveja e tomo um resfriado.
Palavrões e palavras vãs e mais alguns ridículos e desnecessários jogos de palavras. Mas não precisamos disso agora, e eu sempre tento deixar o copo cheio na mesa.
O dia vem no vácuo da noite. E vem a luz e o barulho e minha cabeça dói com meus ouvidos, meus pulmões e todo o corpo resfriado.
Não preciso de nada disso e não preciso de nada. Mas é virtuoso quando alguém deseja algo que não precisa. É virtude, mas é um pouco de mentira também.


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Eram ainda mil novecentos e poucos. Eu falava muito. Mamãe sempre escutava o que eu dizia, com poucas palavras. Eu sempre dizia asneiras, tolices ou ignorâncias. Era o que todos achavam. Eu era mesmo um velho ignorante. Não que eu não soubesse das coisas, mas não gostava de saber de nada, nem de ninguém. Era inteligente, mas tinha quase nenhuma vocação, desde infância, para preocupar-me com as amenidades que as gentes por aí insistem sempre em girtar aos céus e a todos. Eu era um velho gordo, sem jeitos. "Mamãe" era o modo como eu chamava minha velha, minha esposa, minha querida senhora que era meu ponto de equilíbrio com o mundo. Mamãe sempre escutava o que eu dizia, sempre com poucas palavras. Mas essa coisa me incomodava um pouco. Não seria um tipo de concessão a um velho senil? Nunca gostei tanto disso mas, também, não tinha o que falar... deixa a velha em paz!
Meus costumes hoje são poucos. Acordo, tomo um café, que aprendi a engolir depois de velho. Jogo xadrez na praça com outros velhos, tão mais insurportáveis que eu. Depois do xadrez e do almoço, ponho-me a meditar sobre as coisas da vida e do mundo. Nada de mais. Desde os meus primeiros vinte outonos penso na vida e no mundo de forma estúpida e ignorante. Qual mais jeito pra me adequar à vida e ao mundo em que vivo ainda? E que pensem que são bobagens, deixem vocês lá, pensando o que quiserem. São poucos neste mundo que perdem mínimo tempo pensando algo que se valha a pena pensar. A grande maioria só pensa em besteiras, idiotices e pornografias. Não sou o dono da verdade, lógico, mas conheço grande parte das mentiras. O problema é que nem todo mundo consegue enxergar as flores de qualquer jardim ou assumir que sabe das desventuras extraconjugais deste ou qual casal. Nunca liguei pra isso. Aparências, sempre as enxerguei logo abaixo da barriga. Que me desculpem seus pudores mas, no caso de falar sobre aparências, prefiro dissertar sobre genitálias. Nada de mais pra mim, mas seus pudores são praticamente a mesma coisa que todo o resto do universo. Quais diferenças me fazem? Eu que não sei.
Mamãe sempre reclama e me chama de rabujento, desde antes de nos casarmos. Me acho até um pouco compreensível... desde que você explique suas estupidezas de forma coerente e racional. Às vezes penso que deveria me conceder mais a entender certas coisas, mas não tenho disposição suficiente. Não que seja melhor ou mais cômodo, mas falo-ia - e falo viria - a troco de quê, se não vale a pena?
Tem horas que canso. Agora me deu sono. Tenho muito mais a dizer. Espero encontrar disposição assim logo, ou nem tão tarde