quinta-feira, novembro 30, 2006

Relato VII


Aquela mulher, encontrei no mesmo bar que tinha encontrado o Bratelli, anos atrás. Eu estava na mesa, lendo alguma coisa sobre lutas de boxe e com algumas cervejas. Lia sobre boxe de trinta anos atrás, mas não era exatamente sobre boxe que o livro falava.
Certa hora me distraí da leitura e a vi ali fora do bar, com mais quatro pessoas. E que corpo! Nada que passasse no vestibular dos corpos-padrões que meus contemporâneos tanto exigem. Nada que parasse o trânsito ou o comércio, como dizem por aí, mas era um belo corpo. Um belo corpo pra quem sabe apreciar a visão da porta de qualquer boteco, após tomar algumas.
Além de tudo, tinha aquela coisa da experiência, dos seus quarenta e tantos anos. Não precisou três segundos para que ela notasse meus olhares. Insistiu que entrassem no bar, a outra gente, e passaram pela minha mesa. Foram parar lá atrás. Muito trabalho, para mim, ficar me contorcendo na cadeira. Voltei ao livro sobre conversas de boxe e apostas.
Já tinha até me esquecido, muitas páginas depois, e procurei pelo banheiro lá atrás, antes de levantar. Ela devia saber. Com certeza ela sabia! Eu procurando a porta e ela voltando-se pra cá. Olhou bem nos meus olhos, com uma ponta de sorriso, que não era bem sorriso. Algo que não se explica. Quando você vê algo do tipo, você bem sabe o que é. Olhei também e ela não tinha como não sentir o que aquilo significava.
Fui ao banheiro sem olhares e voltei ao boxe. Não tinha pressa. Era tarde ainda, quase noite. Tinha bastante tempo pra fazer bastante coisa, ainda.
Me esqueci novamente na leitura e na cerveja e em outras doses. Não lembrei de nada. Nem do livro, ou do resto da noite. Nem da mulher ou da sua idade. E, talvez, nem me lembre do quanto me cobraram quando fui embora, os caras do bar me levando o dinheiro.
Aliás, lembrei só na manhã seguinte. Aquela loura de farmácia com seus quarenta e tantos anos e aquele corpo belo e grande ao meu lado, na cama, dormindo. Não lembrava muita coisa, mas me sentia muito bem.
Saí bem de leve, sem acordá-la. Deixei um bilhete com o telefone de algum amigo meu. Ela não se lembraria de nada...
Nunca mais nos vimos e ninguém nunca sentiu falta, creio eu.

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Oi! Muito boa esta narrativa! Você é foda!
Biseaus
MInha

sexta-feira, dezembro 01, 2006 9:33:00 AM  
Blogger Alessandro said...

Perfeito! :-)

Abração, camarada!

domingo, dezembro 03, 2006 3:16:00 PM  
Anonymous Anônimo said...

Maneiros seus textos também cara. Tá no favoritos já. Se der, aparece lá para tomar ums geladas e jogar conversa fora. Abraços. Matos Mangusto.

quarta-feira, dezembro 06, 2006 2:06:00 PM  

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