sábado, maio 20, 2006

15/05/2006 (ao Dudu)

A primeira coisa da qual me lembro são os coveiros apressados, arrastando o máximo de terra possível am cada gesto e manuseando sem cuidados a coroa de flores mortas sobre a sepultura. Não havia espaço para lamentos ou filosofias de cemitério no expediente daqueles profissionais preocupados com a pressa em chegar em casa e vegetar com suas famílias. Mas isso é o menos importante, pois havia ainda as recomendações, os gritos e as ameaças, dizendo que fossemos todos embora nos esconder antes mesmo do pôr do sol.
Eu não ouvia nada disso. Para mim era mais importante lamentar e filosofar e talvez até tomar algumas cervejas antes de qualquer coisa.
Nosso amigo, um dos nossos, foi-se embora. Retiraram-lhe a vida com as mesmas tempestividade, frieza e crueldade com que os coveiros empurravam a terra sobre o caixão. Hoje é mais fácil fechar as covas do que abri-las. Ali mesmo eram doze ou treze, apenas à nossa esquerda, onde morríamos um pouco também, quase sem lágrimas.
E no mesmo tempo em que tudo isso acontecia, a cidade retirava-se de cena. Cada cidadão corria como podia às suas casas, castelos ou pensões. Apavorados, ávidos por permanecer ainda mais tempo atrás de suas trancas, blindados ou portas de quarto. Fugiam todos, deixando as ruas todas à mercê apenas dos ventos e dos esgotos. Retiravam-se quase em luto.
A cidade inteira resignou-se aos esconderijos. Nós não!
Ainda que houvesse o cansaço e todas as ameaças suplicantes que arranjássemos qualquer tipo de abrigo, havia também em nós a necessidade e o desejo da procura por qualquer coisa que nos confortasse as mentes.
Conseguimos qualquer coisa e mesmo assim não estávamos completos.
Saímos ainda. Batalhamos nossas pernas ruas adentro e afora, sob a proteção da noite e da cidade foragida, à companhia apenas dos ventos e desgostos. E voltamos depois e bebemos um pouco mais. Afinal de contas, a vida estava ali e merecia ser vivida e brindada ao invés de blindada. Esconder-se disso tudo? Aos vivos, com carinho, chamo de covardia. Eis aí um direito que reservo e respeito apenas aos que se foram.
Abraços!

quarta-feira, maio 17, 2006

Antigos textos

Tem dois textos novos, quer dizer, não exatamente novos, mas recém publicados ali no Antigos Textos. São "O Sanguinolento" e o "E você, quer o quê?". Passem por lá, leiam!

Abraços!