sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Nada


Talvez eu não passe de um grande merda, sendo escritor. Ou talvez o mundo tenha mudado bastante e não seja mais possível escrever decentemente sobre alguma grande noite como esses putos miseráveis e fudidos escreveram a trinta ou oitenta anos atrás. Talvez eu tenha ainda que crescer e viver mais antes de me tornar algum fudido puto miserável e escrever algo que valha sobre as noites ou encontrar lugares e pessoas que valham, nelas.
Acho que nasci tardío, num tempo tardío, onde as mulheres continuam abrindo as pernas em suas saias nas outras mesas dos bares e os homens continuam deperdiçando socos pelas noites e as bebidas e as drogas e as sobriedades fazem tanto efeito quanto antes faziam.
Talvez eu não passe de um grande merda, sendo escritor, que não consigo mentir tão bem e transformar em sinfonia de palavras todas essas notas de ações caóticas que se aglomeram e se multimplicam entre todas as horas das reconfortantes escuridões.
Noites outrora muito mais brilhantes que os néons e gritos que assisto e que perco tempo assistindo-os.
Noites, hoje, são só noites, ao meu ver.
E talvez já fossem antes, nas brilhantes páginas amareladas que gosto de chorar.
Talvez eu não passe de um grande merda puto, miserável e fudido, sendo assim, tão mentiroso.

Escuro Silêncio


Escuro, escuro.
E quem vê? Não importa.
Nem eu me importava.

Pólvora. Facas. Assassinatos a sangue frio rolando soltos pelos dias.

É um filho que me mata, uma mãe que me afoga e diz que esqueceu, garotos mimados com tochas nas mãos e meu corpo, de tanto álccol, queima até acabar-se em pó, com alguma sorte, n´alguma calçada d´algum bairro rico do chão de mármore.

Silêncio, silêncio.
E quem ouve? Não importa.
Nem eu me importava.
E nem escutava.
Só calava.
Silêncio.

Eram assassinatos a sangue quente. Era por raiva, por besteiras ou por nada.

Era meus dedos no gatilho, a faca em minhas mãos ou a grana no meu bolso pra encomendar a morte daquele tal.

Se tú me cagueta, tú morre!
Se tú me entrega, eu faço faculdade, viro chefe e te mando pro inferno, lá da prisão.

E eu nem me importo.
Nem me importava.

Eram prostitutas, coitadas, açoitadas por quilômetros até o fim da vida, mas não da viagem. Eram filhos morrendo na frente dos pais, dizendo o último adeus com os olhos lacrimejados de morrerem tão cedo. Eram pais morrendo na frente dos filhos. Filhos que nunca vão acreditar no poder daqueles projéteis atravessando a testa dos velhos. Filhos, apenas crianças, coitados. E eram também crianças arrastadas por carros por quilômetros, conhecendo o fim da viagem muito antes de qualquer começo.

E quem sabe? Não importa.
Nem eu me importava.
Não mesmo.

Mas agora... agora que me bateu o desatino de querer saber de alguma coisa, não adianta nada. Não dá mais tempo nesse escuro, nesse silêncio...
Já fui acalentado pela morte...

Já fui acalentado por facas, balas, asfalto, facas, mãos, fome, fadiga, vírus, raiva, desdém, esquecimentos, exclusões, desculpas.

Já fui acalentado pela morte... precoce e pueril surpresa.

Talvez vocês.